Considerando
que o advogado deve esclarecer seu cliente sobre os limites de sua
atuação, faltar com esse dever caracteriza ato ilícito, passível de
indenização.
Com esse entendimento, a 20ª Câmara Cível do Tribunal
de Justiça do Rio de Janeiro confirmou, por unanimidade, decisão de
primeiro grau que condenou um advogado a indenizar sua ex-cliente em R$
4,4 mil por danos morais e materiais. O acórdão foi julgado no dia 4 de dezembro.
No
caso, a autora da ação contratou os serviços do advogado em janeiro de
2008 para atuar nos autos de uma reclamação trabalhista na 61ª Vara do
Trabalho da comarca de São Paulo. Na troca de e-mails, seus pedidos de
informações sobre o processo eram respondidos de forma lacônica pelo
advogado, que apenas dizia estar cuidando do caso.
Passados dois
anos do acordo e após ter desembolsado R$ 400 a título de honorários, a
cliente descobriu que o advogado sequer juntara aos autos a procuração
que lhe foi confiada. Revel no processo, tendo sofrido reiteradas
penhoras online nas contas correntes em que recebe seus proventos, ela
viu sua dívida trabalhista ser majorada ao longo desse período.
Diante
disso, a cliente revogou a procuração e ajuizou ação requerendo a
condenação do advogado ao pagamento de indenização por danos materiais
pelos honorários pagos e danos morais em valor a ser arbitrado pelo
juízo.
Em sua contestação, o advogado afirma ter sido procurado
pela autora para que descobrisse o motivo de um bloqueio de seu salário.
Assim que foi informada, ela teria pedido a ele um “suporte jurídico”
ao processo, que consistia em informações sobre o andamento processual e
análise do andamento. Segundo ele, o trabalho contratado corresponderia
somente às informações jurídicas, sem a “efetiva atuação nos autos”.
Por essa razão, o valor total acertado, de R$ 800, é inferior ao
estipulado na tabela da OAB correspondente a uma consulta ou parecer já
em litígio. Além disso, ele não teria sido contratado para atuar
diretamente na vara de São Paulo.
Ainda por conta desse caso, o
advogado chegou a ser alvo de processo administrativo disciplinar
instaurado pelo Tribunal de Ética e Disciplina da OAB de São Paulo.
Segundo o parecer preliminar, o profissional não cumpriu com sua
“responsabilidade” ao deixar de esclarecer a sua ex-cliente “de forma
clara e objetiva qual era o objeto de seu trabalho”. O processo foi
arquivado.
Para o desembargador Marco Antonio Ibrahim, que relatou
o acórdão, o advogado faltou com o “dever de informação”. No seu
entendimento, esse dever não se resume “aos riscos da pretensão e das
consequências que poderão advir da demanda”, mas está inserido também
nos limites do contrato, baseado na ética e boa-fé que devem permear as
relações entre os indivíduos, a exemplo do que dispõe o artigo 422 do
Código Civil.
“Não cabia à parte autora saber a diferença entre as
atividades privativas da advocacia, previstas no artigo 1º da Lei
8.906/1994, ou que havia contratado um advogado apenas para lhe dar
suporte jurídico ou prestar serviço de análise de questão jurídica
existente. Tampouco se a atuação do advogado dependia de procuração em
via original ou se mera cópia fax era suficiente. Todavia, cabia ao
apelante, advogado, profissional habilitado e com conhecimento técnico,
orientar sua cliente sobre os limites da sua atuação, o que não fez”,
afirmou o relator.
Já o juiz Ricardo Rocha, da 2ª Vara Cível de
Petrópolis, havia concluído em primeiro grau que a extensão dos serviços
contratados era ampla, cabendo ao advogado promover a defesa de sua
cliente em todos os atos do processo, ainda que já se encontrasse na
fase de penhora de créditos.
O magistrado assinalou que a troca de
mensagem entre as partes reforça a impressão de que a atuação
contratada era, de fato, de caráter processual, concreta, voltada para
resultados práticos que favorecessem a autora, e não apenas de uma mera
assessoria informativa. “Tanto assim que, na mensagem de fl.39, o
próprio réu assinala que iria enviar 'petição' para a vara em SP, sendo
que, mais adiante, na mensagem de fl.42, diz que teria feito um
'despacho' (?), aguardando a posição da vara”, descreve.
Segundo
Ricardo Rocha, a hipótese diversa implicaria o lançamento de cláusula
restritiva, algo simples de ser elaborado para um advogado, bastando a
referência de que o trabalho seria apenas de assessoria.
O juiz
ressalta, ainda, o fato de que, nas mensagens eletrônicas, é sempre da
autora a iniciativa de solicitar informações, e não o contrário, o que,
segundo ele, “denota a inércia do advogado, que em geral respondia até
laconicamente”.
Para Rocha, não restam dúvidas sobre a “conduta
culposa” do advogado. “Ora, o fato de a parte autora, por mais de dois
anos, não ter recebido a correta prestação de serviços do réu, relativo a
processo judicial em que pendia penhora de sua conta bancária, em que
até recebia proventos de natureza alimentar, tendo solicitado, por
diversas vezes, informações e explicações, sem merecer a resposta
devida, e nem o resultado processual pretendido, certamente gera o
nascimento deste fenômeno jurídico, sendo merecida, portanto, uma
reparação, como requerida na petição inicial, já que induvidosa a série
de aborrecimentos sofridos em virtude desta circunstância”, conclui.
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