O Conselho Nacional de Justiça (CNJ) aprovou, em dezembro, recomendação para que os tribunais brasileiros regulamentem a atuação dos Oficiais de Justiça como incentivadores da conciliação durante o cumprimento de mandados judiciais. A orientação autoriza que esses servidores informem as partes sobre a possibilidade de autocomposição e certifiquem, nos autos, propostas de acordo apresentadas no momento da diligência, mas estabelece limites claros quanto à atuação direta na mediação e na conciliação.
A orientação é uma resposta à Consulta 0003903-96.2025.2.00.0000, feita pelas associações Afojebra e Fenassojaf, e pela Fesojus (Federação Sindical dos Oficiais de Justiça). O voto da relatora, conselheira Mônica Nobre, foi aprovado por maioria na 17ª Sessão Virtual de 2025, encerrada em 19 de dezembro.
A decisão reforça o entendimento de que os Oficiais de Justiça não podem exercer funções típicas de conciliadores ou mediadores. Segundo o Conselho, é vedada a condução direta de negociações, a realização de reuniões presenciais ou virtuais com objetivo de mediação, bem como qualquer atuação ativa na construção do acordo entre as partes. O CNJ fundamenta essa restrição na necessidade de preservar a imparcialidade, a confidencialidade e as garantias próprias dos procedimentos formais de mediação e conciliação, que possuem disciplina legal específica.
Ao mesmo tempo, o CNJ reconhece que o marco legal processual já confere aos Oficiais de Justiça um papel relevante na promoção da autocomposição. O Código de Processo Civil prevê expressamente que, no cumprimento do mandado, o Oficial de Justiça pode certificar nos autos eventual proposta de acordo apresentada por qualquer das partes, cabendo ao magistrado analisar e encaminhar a solução consensual.
Na prática, a recomendação orienta os tribunais a editar normas internas detalhando como essa atuação deve ocorrer. Entre os pontos destacados estão a definição de procedimentos objetivos para que o Oficial de Justiça informe sobre a possibilidade de acordo, registre fielmente a manifestação das partes e comunique o juízo, sem interferir no conteúdo da proposta ou atuar como mediador do conflito. O CNJ também ressalta a importância de capacitação específica, voltada à comunicação institucional adequada e ao estímulo responsável da cultura da conciliação.
A posição adotada pelo CNJ, no entanto, surge em um contexto de debate mais amplo sobre a ampliação das atribuições dos Oficiais de Justiça no sistema de Justiça brasileiro. Recentemente, a Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania (CCJC) da Câmara dos Deputados aprovou o Projeto de Lei nº 9.609/2018 e propostas apensadas, que promovem uma atualização significativa das atribuições desses servidores. O texto aprovado segue agora para análise do Senado Federal, caso não haja recurso para apreciação em plenário.
Entre os pontos centrais do projeto aprovado na Câmara está justamente o fortalecimento do papel dos Oficiais de Justiça na promoção da autocomposição. Pelo texto, caberia ao Oficial incentivar e realizar a conciliação e a mediação no curso dos atos processuais que lhe forem atribuídos, além de certificar nos autos propostas de acordo quando não houver consenso imediato. A proposta também amplia de forma expressiva as atribuições técnicas, incluindo inspeções, arrolamentos, arrecadações, atividades de inteligência processual, atos de constrição patrimonial, realização de leilões judiciais, fiscalização de medidas penais e, em determinadas condições, atuação como juiz leigo.
A coexistência da recomendação do CNJ — que veda a mediação direta pelos Oficiais de Justiça — com o projeto aprovado na Câmara evidencia posição totalmente divergente. Enquanto o Conselho adota uma interpretação restritiva baseada no marco legal vigente, o Legislativo discute uma redefinição mais ampla do papel desses servidores, alinhada à lógica de celeridade, eficiência e pacificação social introduzida pelo Código de Processo Civil de 2015.
Especialistas apontam que, caso o projeto venha a ser aprovado pelo Senado e sancionado, será necessário um novo alinhamento normativo, inclusive no âmbito do próprio CNJ, para compatibilizar as recomendações administrativas com a legislação federal. Até lá, permanece válida a orientação de que os Oficiais de Justiça podem estimular a autocomposição e certificar propostas apresentadas pelas partes, mas não atuar como mediadores ou conciliadores formais.
O debate ocorre em um momento de crescente valorização das soluções consensuais e de busca por maior efetividade na prestação jurisdicional. A regulamentação cuidadosa dessa atuação é vista como essencial para evitar conflitos de atribuições, garantir segurança jurídica e preservar a confiança das partes no sistema de Justiça.

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