Juízes,
desembargadores e servidores do Judiciário estão temerosos quanto à
segurança de suas aposentadorias, que ruma em direção aos fundos
privados. Foi rejeitada no Plenário da Câmara, nesta quarta-feira
(29/2), a emenda que pretendia tirar os servidores do Poder Judiciário
do Projeto de Lei 1.992/07, que cria o Fundo de Pensão dos Servidores
Públicos Federais. A proposta que define um teto para contribuição e
transfere para entidades privadas a administração do fundo complementar
foi aprovada na última terça-feira (28/2) pela Câmara.
O projeto
que segue para votação no Senado iguala o teto das aposentadorias dos
servidores públicos federais ao do regime privado da previdência, com
valor máximo do benefício pago pela União de R$ 3.916,20 (atual teto do
INSS), reduzindo também a contribuição obrigatória do servidor para 11%
deste valor. Quem quiser ter uma carteira mais gorda ao se aposentar
terá de pagar contribuição a um fundo complementar. O governo
contribuirá com a mesma quantia que for depositado neste fundo, até o
limite de 8,5% do salário do servidor. Os valores acima disso não serão
levados em conta pelos cofres públicos.
Um dos principais problemas do projeto apontados pelo presidente da Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe)
Gabriel Wedy
é a insegurança gerada pelo modelo adotado: o de contribuição definida.
No modelo, o contribuinte "sabe o quanto paga, mas não sabe com quanto
vai se aposentar", explica. A quantia depositada no fundo complementar é
usada em investimentos. Se eles renderem muito, o valor da
aposentadoria será alto, se eles renderem pouco, o valor da
aposentadoria será baixo. O outro modelo possível seria o de benefício
definido, onde os depósitos mensais variam de forma a garantir uma
aposentadoria de valor pré-definido.
Atualmente, os servidores do
Judiciário Federal contribuem obrigatoriamente com 11% de seus
vencimentos brutos e, ao se aposentar, recebem a média salarial das 80
maiores contribuições, o que costuma ficar um pouco abaixo do salário
com que se aposentaram. A contribuição de 11% ao fundo de pensão
continua sendo feita com o dinheiro recebido durante a aposentadoria.
"A
preocupação é com a segurança desse projeto, se os valores que
contribuímos hoje em dia fossem para fundos de previdência privada,
teríamos direito a receber cerca de 10 vezes o que ganhamos, mas
preferimos a certeza a deixar esse dinheiro ser aplicado com risco", diz
Wedy.
Constitucionalidade questionada
Assim como a Ajufe, a Associação dos Magistrados do Brasil
(AMB) contesta a constitucionalidade do projeto de lei. As entidades
afirmam que a mudança no regime previdenciário da magistratura só pode
ser tratada por lei complementar de iniciativa do Supremo Tribunal
Federal. "Vamos debater o mesmo tema no Senado [que precisa aprovar o
projeto] e esperamos que acolham nossa objeção de ordem formal",
declarou o presidente da AMB,
Nelson Calandra.
Calandra
também aponta inconstitucionalidade do projeto por conta da discussão
em torno dele não ter abarcado a responsabilidade fiscal. "Aprovar um
projeto de lei como esse sem ter debatido os limites financeiros do
investimento da União no fundo é como lançar um navio ao mar sem
âncora", diz o presidente da AMB.
Seguindo essa linha de
raciocínio, o deputado federal João Dado (PDT-SP) entrou com o Mandado
de Segurança 31.188 no STF nesta quarta-feira (29/2) para anular a
votação da Câmara dos Deputados que aprovou, a criação do Funpresp. A
ação pede que seja determinado ao presidente da Casa, deputado Marco
Maia (PT-RS), que encaminhe o projeto à Comissão de Finanças e
Tributação (CFT), a fim de que seja cumprida a regra regimental que
prevê a manifestação desta comissão sobre a existência de adequação
orçamentária e financeira das propostas legislativas.
Gabriel Wedy
aponta, ainda, outras inconstitucionalidades: para ele, o mesmo fundo
administrar as aposentadorias dos servidores do Ministério Público e dos
magistrados não condiz com o texto constitucional e a criação de dois
regimes previdenciários para servidores da mesma carreira, uma vez que o
novo regime valerá apenas para aqueles que ingressarem na magistratura e
no Ministério Público depois da lei entrar em vigor.
Outro
problema do projeto de lei é a falta de diferenciação entre grupos de
contribuintes, afirma o coordenador de comunicação da Federação Nacional
dos Servidores da Justiça Federal (Fenajufe),
Jean Loiola.
"O legislador criou grupos distintos para benefícios, pois mulheres e
homens devem contribuir de formas diferentes, por exemplo. Estas
distinções não está clara no texto sobre o Funpresp."
Já o advogado especialista em previdência complementar,
Renan Aguiar,
presidente da Escola Superior de Advocacia da seccional fluminense da
Ordem dos Advogados do Brasil, o projeto não viola em nenhum momento a
Constituição Federal. Para ele, a Carta Magna permite que a
aposentadoria do magistrado seja definida fora da Lei Orgânica da
Magistratura, sem a necessidade de ser uma lei complementar. No caso do
MP é diferente, pois a lei complementar que regulamenta o órgão afirma
que seus membros possuem aposentadoria integral.
Para Aguiar, a
aprovação do PL 1.992/07 é um movimento natural do Brasil, que segue
"uma tendência mundial de desonerar o Estado no que diz respeito à
previdência". Segundo o advogado, o modelo atual vive uma crise na qual
os Estados são obrigados a injetar dinheiro para manter os ganhos
prometidos. "Dessa nova forma, entrega-se na mão do servidor a
responsabilidade por sua aposentadoria."
Para Gabriel Wedy, da
Ajufe, as mãos que recebem as aposentadorias não são as dos servidores,
mas da iniciativa privada, "que tem exercido enorme pressão no governo
para passar a administrar essas quantias bilionárias". Ele concorda,
porém, que o movimento é mundial, mas compara o modelo brasileiro ao do
Chile, país que entrou em grave crise após a mudança do regime
previdenciário.
A aplicação do teto da Previdência Social está
prevista na Constituição desde a Reforma da Previdência de 1998 e deverá
ser aplicada inclusive aos servidores das autarquias e fundações e aos
membros do Poder Judiciário, do Ministério Público e do Tribunal de
Contas da União.
Clique aqui para ler a íntegra do PL 1.992/07.