Sindicato vê tratamento punitivo e discriminatório em “compensação” de mandados sem fundamento para servidores que estiveram em atividade ininterrupta durante toda a pandemia.
Integrantes do segmento da categoria mais exposto aos riscos de contaminação pelo SarsCov-2, oficiais de justiça têm sido penalizados pela administração da Central Unificada da Justiça Federal (Ceuni) da capital com a imposição de carga adicional de mandados para servidores que tiveram de permanecer temporariamente em trabalho remoto na pandemia.
Em 2020, após o início da retomada parcial das atividades presenciais na Justiça Federal, a Ceuni impôs uma duvidosa “compensação” de mandados a esses oficiais, mantida inclusive no atual momento de recrudescimento da pandemia, na contramão das restrições sanitárias.
Gestão pandêmica
O Sintrajud repudia e defende a reversão da determinação de compensação de horas, baixada pela gestão Mairan Maia, a colegas que, em razão da pandemia, não tenham podido cumprir as suas jornadas regulares, independentemente do cargo ocupado. Para o Sindicato, esses servidores não podem ser penalizados por uma situação de força maior, à qual não deram causa. Além disso, ao longo de todo este período os trabalhadores sempre estiveram à disposição para o cumprimento de tarefas designadas pela administração em consonância com a carreira e as necessidades de preservação da segurança sanitária. Porém, no caso dos oficiais, há o elemento adicional de que não houve períodos de inatividade forçada.
Parte dos oficiais foi afastada das atividades presenciais em razão de idade, comorbidades ou coabitação com pessoas nessa condição, e continuaram exercendo suas funções por meio remoto, conforme as portarias do Tribunal e ordens de serviço da Diretoria do Foro. As normas trataram da situação das pessoas no chamado “grupo de risco” e reconheceram expressamente a validade e a prioridade dos meios eletrônicos, sempre que possível, para o cumprimento de mandados durante a pandemia.
Apesar disso, a diretora da Central, Adriana Faro, e a juíza corregedora da unidade, Paula Mantovani Avelino, determinaram a “compensação de horas” aos oficiais, em razão de uma suposta insuficiência de atividades no trabalho remoto. Sem demonstração de como chegou ao critério adotado, a diretora afirmou vagamente entender como “razoável” a distribuição de mais dois mandados por dia útil de afastamento da atividade presencial, no que foi endossada pela magistrada.
Meses depois, as gestoras determinaram a devolução, em um prazo de cinco dias, dos mandados mais antigos em posse desses oficiais, cujo cumprimento remoto não tinha sido possível, e estabeleceram um novo plano de “compensação”, cumulativo ao primeiro: mais dois mandados para cada um desses devolvidos.
Ironicamente, parte desses mandados foi redistribuída aos mesmos servidores, após retornarem ao trabalho presencial, acrescidos da “pena” de mais dois.
Para não ter de devolver os mandados e, assim, cumprir mais dois para cada um devolvido, as gestoras “facultaram” o retorno imediato à atividade presencial. As determinações evidenciam a pressão para que os servidores, diante do passivo crescente, renunciassem à condição de risco antecipando o retorno ao trabalho nas ruas, mesmo quando a vacinação ainda não começara ou era incipiente.
Esses servidores também foram excluídos da distribuição nos plantões, o que os impediu de cumprir eletronicamente um número maior de mandados. Apesar disso, continuaram recebendo normalmente os mandados correspondentes às suas áreas (mandados de CEP), e com eles permanecem em suas caixas até o efetivo cumprimento, ainda que de forma presencial, quando possível.
Os colegas relatam que, apesar das limitações do meio virtual, puderam cumprir um grande volume de mandados, fato que é comprovado.
A avaliação é de que, ao falar em “compensação”, a administração desconsidera não apenas esse trabalho e todo o tempo à disposição, como também o fato de que muitas vezes um único mandado exige várias pesquisas e contatos, e que mesmo os mandados negativos foram objeto de tentativas que demandaram tempo e esforços.
Função de risco e injustiças contra quem promove a justiça
Além da maior vulnerabilidade, em razão da atividade externa e pelo contato direto com pessoas destinatárias dos atos judiciais – encontradas muitas vezes sem máscaras de proteção ou declaradamente infectadas – os oficiais também têm enfrentado uma série de outros problemas na desde o início da pandemia. Materiais de proteção, como máscaras e álcool gel, começaram a ser disponibilizados tardiamente e de forma precária. A falta de respostas da administração chegou a motivar uma ação judicial do Sintrajud cobrando a observância das normas de segurança na Justiça Federal (saiba mais aqui).
No último mês foram solicitadas novas informações sobre a regularidade do fornecimento desses produtos, especialmente das máscaras PFF2, comprovadamente mais seguras; sem prejuízo da reivindicação de suspensão do expediente presencial neste momento da pandemia.
Os servidores também enfrentaram a abertura precoce da sala da Central e a convocação para plantões ordinários presenciais, considerados desnecessários para a distribuição de mandados.
Colegas também foram prejudicados em seus períodos de férias, em razão do acúmulo involuntário de mandados e da impossibilidade de cumprir os prazos ordinários. “Há cobranças de cumprimento presencial de mandados dentro dos prazos normais pré-pandemia, como se a emergência sanitária e as restrições que ela impõe não fossem uma realidade que os oficiais vêm enfrentando desde o início sem deixar de cumprir seus deveres”, relata o diretor do Sindicato Tarcisio Ferreira.
Outro prejuízo imposto aos oficiais, que o Sindicato também questiona, foi a supressão da indenização de transporte durante os períodos sem trabalho presencial. Além de não terem deixado de cumprir mandados virtualmente, as despesas de manutenção de veículo são permanentes, e os mandados acumulados não deixam de ser cumpridos, posteriormente.
Mesmo se fosse admitida alguma compensação, a Central também não tem aceitado a comprovação de horas de cursos para abatimento, em contrariedade ao que prevê portaria do TRF.
Ação sindical
A categoria aguarda julgamento de recursos apresentados pelo Sintrajud ao Conselho da Justiça Federal da 3ª Região, após as medidas terem sido mantidas pelo diretor do Foro da Seção Judiciária de São Paulo, juiz Márcio Ferro Catapani. O Sindicato defende a reversão das determinações, por entender que significam efetiva punição a esses servidores que, além da situação involuntária de maior vulnerabilidade à doença, recebem uma carga adicional de mandados, avaliada como desproporcional e injustificada. “Insistimos para que a administração reconsidere; não se tem conhecimento de semelhante postura em outras centrais ou tribunais”, declara Tarcisio.
Antes da política de compensação, a gestão da central inicialmente relutou em reconhecer a situação do ‘grupo de risco’, e depois, com base em uma suposta incompatibilidade com o teletrabalho extraordinário, tentou impor a todos o desvio de função, que foi derrotado (leia aqui). “Ironicamente, se o desvio tivesse se concretizado, esses oficiais não teriam realizado tantas diligências virtuais nem poderiam ter ‘horas’ cobradas. Essa é mais uma demonstração do caráter punitivo da medida. Além disso, mesmo quem optou por prestar serviço em outros setores continuou recebendo mandados e também sofre com sobrecarga e cobranças”, aponta Tarcisio.
Fonte: Sintrajud
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