O Jornal ‘A Praça’, edição do dia 19 de novembro de 2011, publicou
matéria em que abordava a designação do Juiz Dr. Ricardo Alexandre para o
Juizado Especial Cível e Criminal de Iguatu. Noticiou-se, na mesma
matéria, que o referido magistrado, além da Comarca de Iguatu, também
estaria responsável pelas vizinhas comarcas de Cedro e Quixelô, somando,
sob sua responsabilidade, um contingente populacional de
aproximadamente 150 mil jurisdicionados.
Tal fato, a
princípio, pode até passar despercebido e não causar qualquer
preocupação. Entretanto, em que pesem a devoção pelo trabalho, o enorme
senso de responsabilidade, o preparo técnico e intelectual que
caracterizam o citado juiz, a quem atribuo outras importantes qualidades
como profissional e cidadão, a situação exposta é, no mínimo, de causar
assombro, não só aos profissionais que atuam perante o Judiciário, em
especial advogados, promotores e defensores públicos, como a toda a
sociedade, verdadeira destinatária da prestação jurisdicional.
Utilizando-nos
desta exemplar situação, questionamos e, repetidamente, denunciamos
nosso descontentamento diante da certeza de que não se pode ter como
razoável a sobrecarga de trabalho atribuída àquele juiz e, como sabemos,
a tantos outros magistrados cearenses, alguns deles com a
responsabilidade de responder por até cinco ou seis comarcas diferentes,
visto que, por maior que seja o afinco profissional destes devotados
juízes, eles jamais terão condições de fazer o que é a atribuição não de
um juiz apenas, mas de outros três, quatro ou cinco juízes.
E não
podemos exigir que o façam, uma vez que não se pode permitir que o
trabalho da Justiça seja resultado do sacrifício pessoal de alguns
vocacionados magistrados.
E é gravíssimo sabermos que esta
situação é hoje corrente não só em nossa Região Centro Sul, mas em todo o
interior do Estado do Ceará.
Com efeito, conforme levantamento por nós realizado em data recente, das 16 comarcas que compõem a Subseção da OAB de Iguatu, nada menos que 13 delas estão sem juízes titulares e, nas comarcas em que há esta rara figura pública, estes, regra geral, respondem por, pelo menos, três Varas Judiciárias, Juizados ou Comarcas, cumulativamente.
Tal fato leva à triste constatação de que,
em todo o Estado do Ceará, cerca de sete, em cada dez comarcas, vive
esta triste experiência, gerada - e potencializada - em razão da
evidência de uma outra constatação: existem atualmente 135 cargos vagos
na magistratura cearense e outros tantos cargos vagos nos serviços
auxiliares (técnicos, analistas e oficiais de justiça) que, neste caso,
na grande maioria das comarcas vêm sendo realizados por funcionários
cedidos pelas prefeituras, a maior parte sem qualificação e preparo
técnicos suficientes para o exercício dessas importantes atribuições.
A
breve amostra exposta até aqui desnuda o estado de calamidade que hoje
vive a Justiça Cearense, retratando o caos ali instalado e que, segundo
informações consolidadas pelo Conselho Nacional de Justiça – CNJ, órgão
responsável pelo controle externo do Judiciário, colocou o Ceará na
vergonhosa posição média de 5º pior do País em número de processos
acumulados, com um acúmulo de congestionamento de 73,5% (que é resultado
da soma total de ações em tramitação e novas ações ajuizadas em cada
ano, menos as ações que foram encerradas no mesmo período).
E
tem mais. O Ceará ocupa a desonrosa posição de 6º pior Estado da
Federação em número total de servidores e magistrados; 5º pior em número
de cargos de magistrados de 1º grau por 100 mil habitantes, com 464
cargos existentes - (6,3/100 mil hab.), à frente apenas de Piauí, Bahia,
Amazonas e Pará; 4º pior em número efetivo de magistrados por 100 mil
habitantes (4,7/100 mil hab.), implicando no total de 135 cargos vagos, à
frente apenas do Pará, Rio de Janeiro e Bahia; 2º pior em número de
servidores (54/100 mil hab), à frente apenas do Pará e 3º pior em número
de servidores efetivos (33/100 mil hab.), à frente apenas do Pará e
Alagoas.
Estes dados retratam justamente a falta de estrutura
suficiente de pessoal (juízes e servidores), sem falar da ausência de
estrutura material (equipamentos e modernização dos sistemas de
tecnologia) que, de forma imediata, impossibilitam a agilidade nos
trabalhos da Justiça e revelam a inegável da falta de compromisso do
Poder Público em dar uma efetiva solução para estes problemas, já
crônicos, que paralisam a máquina judiciária, deixando a sociedade
desprovida de acesso à prestação jurisdicional e, quando menos, obrigada
a vivenciar o prolongamento de suas demandas, em prejuízo da
pacificação social, com o danoso favorecimento à impunidade e à
criminalidade.
A Justiça Cearense está, portanto, em total
descompasso com as garantias e direitos fundamentais do cidadão, em
especial aos dispostos nos incisos XXXV e LXXVIII do art. 5º da
Constituição Federal, que proclamam, respectivamente, o acesso à justiça
(“a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a
direito”) e a agilidade nos julgamentos (“a todos (...) são assegurados
a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de
sua tramitação”).
A sociedade cearense, por sua vez,
encontra-se sedenta de Justiça e, em razão disso, faz-se imperiosa a
conclamação de todos os seus segmentos organizados para as ações já
encampadas pela Ordem dos Advogados do Brasil, Seção do Estado do Ceará,
em defesa dos princípios democráticos e do Poder Judiciário, através
das denúncias e cobranças, exigindo dos poderes públicos providências
urgentes e efetivas contra este estado caótico destinadas a dar uma
solução para a crise que se instalou e que emperra a máquina judiciária
que, além de violentar os princípios do Estado Democrático de Direito,
constitui uma evidente VERGONHA.
(*) Presidente da OAB – Subseção Iguatu.
Artigo publicado no Jornal a Praça, 03-03-2012 http://www.jornalapraca.com.br/
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