Por
um lado, dificuldades na entrega de ordens judiciais, como ficar
escondido às 4 horas da manhã na porta de uma empresa de ônibus para
penhorar recursos que estão em um carro-forte. Por outro, a satisfação
de saber que é responsável pelo cumprimento de uma decisão que irá
beneficiar alguma pessoa. Essa é realidade dos 70 oficiais de Justiça do
Tribunal Regional do Trabalho da 10ª Região (TRT10) que atuam no
Distrito Federal, tema da terceira última reportagem da série sobre a
rotina desses profissionais. Em 2012, 44.275 mandados judiciais foram
cumpridos no DF.
Há 13
anos como oficiala do TRT10, Karina Silveira Bona foi a protagonista da
“operação” para penhorar os recursos do carro-forte. Para isso, contou
com a ajuda da polícia. “Fiquei escondida na entrada, entrei na viatura e
seguimos o carro forte. Não permitiram a minha entrada na empresa para
contar o dinheiro e tive de fazer isso ao ar livre, sentada no chão do
pátio interno. E eram muitas moedas e cédulas de R$ 2, já que era o
dinheiro das passagens de ônibus”, conta.
Segundo
ela, a maior dificuldade que encontra é com os grandes empresários.
“Muitos se recusam a assinar e não permitem que os funcionários assinem.
Alguns também escondem bens que poderiam ser penhorados”, relata. Por
sua vez, quando a pessoa é mais humilde, o lado “psicólogo” do oficial
tem de agir. “Muitos não sabem por que um ex-empregado entrou na Justiça
contra eles, já que a relação entre eles era boa”, conta.
Nessa
hora, o oficial precisa explicar o conteúdo do mandado. “Em alguns
casos, tomo cafezinho com a pessoa para que ela entenda o que aconteceu e
sempre digo que o pior é não pagar”, conta. Mesmo tendo preparo e
sabendo que tem de cumprir seu trabalho, o oficial não está imune a se
abalar com algumas situações.
Sensibilidade e força
- Karina conta que, uma vez, a pessoa que iria receber a ordem judicial
estava claramente com a saúde comprometida devido a um câncer avançado.
“Pedi ao juiz a suspensão da diligência. Também me cortou o coração
quando tive de cumprir a ordem de penhora de uma TV de uma família
simples. Não somos feitos de gelo. Também ficamos sensíveis. Mas temos
que nos mostrar fortes”, diz.
Apesar
desse tipo de dificuldade, Karina está satisfeita com a profissão.
“Adoro ser oficiala. Tenho flexibilidade de horário, não fico presa no
trabalho e consigo conciliar compromissos familiares”, aponta.
O
chefe do Núcleo de Mandados Judiciais do TRT10, Luiz Antônio dos
Santos, destaca que qualquer diligência coloca em risco a vida do
oficial, pois ele desconhece a pessoa que está procurando. “Pode ser um
bandido ou uma pessoa bruta. O oficial precisa ter destreza, consciência
do risco que corre, saber ouvir e ter controle emocional. Ele tem que
ter em mente que não é nada pessoal e que precisa realizar o trabalho.
Tem que ser firme quando tiver que ser”, afirma.
Quando
é necessário, pode ir mais de um oficial na diligência e, em casos que
houver um risco maios, a Polícia Militar é chamada para acompanhar os
servidores. “Não abrimos mão da segurança”, reforça Luiz Antônio.
“Só a cor do carro”
- E quando o executado é um policial? A penhora do carro de um delegado
da Polícia Civil deu trabalho para oficiais do TRT10. O policial se
recusava a entregar o carro, que havia sido arrematado num leilão para o
pagamento de uma dívida. Numa das tentativas, o delegado chegou a sair
da sua garagem com o carro na frente dos oficiais e disse: “vocês vão
levar só a cor do carro”. Somente com a interferência da Polícia Federal
e depois de três meses, o veículo foi entregue.
O
cumprimento da ordem judicial pode demorar ainda mais. O despejo de
moradores de um sítio, por exemplo, só foi efetuado após oito meses. Dos
24 ocupantes do local, metade era criança. Nesses casos, os oficiais
entram em contato com o Conselho Tutelar e a Secretaria de
Desenvolvimento Social do DF para auxiliar na missão. E há situações
onde é impossível cumprir o mandado, como quando a pessoa que deveria
pagar uma dívida está completamente sem dinheiro e não tem nenhum bem
para ser penhorado.
Outros
casos curiosos aconteceram com oficiais do TRT10 em Brasília,
principalmente quando a pessoa que perdeu a ação não quer receber a
ordem judicial e mente que não está em casa. Em um dos episódios, como o
dono da casa se recusava a deixar os oficiais entrarem, a polícia teve
de arrombar três portas de uma casa no Lago Sul para pegar um sofá de
couro que havia sido penhorado. Deparar-se com pessoas com roupas
inadequadas, como um roupão de dormir, também é algo que acontece com os
oficiais. Nesse caso, o servidor solicita que a pessoa se recomponha
antes de fazer seu trabalho.
Cadê a casa?
- O oficial Raphael Gomes de Araujo se depara com uma dificuldade
prosaica: achar o endereço das pessoas para quem deve entregar o
mandado. Ele atua em Arniqueiras, onde há predominância de imóveis
rurais. “As chácaras não são identificadas e não têm sequência”, aponta
Raphael, que é autor do livro “Oficial de Justiça – Abordagem teórica e
procedimentos práticos”, junto com Arnoldo Braga Filho e Sônia Gundim
Silva.
Segundo ele, o oficial
precisa ter bom senso, ética e paciência. “Deixo as pessoas falarem,
cortar pode ser pior. Esclareço que não fui eu quem decidiu o mérito da
questão”, conta. Raphael admite que o seu trabalho é solitário e, às
vezes, tem uma carga negativa, pois o oficial é, na maioria das vezes,
portador de uma notícia ruim para quem está o recebendo. Mesmo assim,
ele diz sentir reconhecimento do seu trabalho por parte da sociedade.
Há
21 anos como oficial no DF, Alan Rogério Ribeiro Fialho confirma que o
estresse faz parte da profissão, como, por exemplo, quando crianças
acompanham o cumprimento de uma ordem judicial ou quando a missão é
feita em lugares e horários perigosos. “Mas é um trabalho gratificante.
Somos a ponta da prestação jurisdicional”, resume Alan, ecoando a
opinião recorrente dos colegas.
R.P. - imprensa@trt10.jus.br
Fonte: TRT-10
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